A poesia me embalou desde tempos gestacionais, quando eu era um peixinho na barriga da mamãe. Poesia chorada de um lamento de desamparo de uma gestação vivida só. Poesia alegre da esperança de uma guerreira por dias melhores.
Brotei na luz do mundo e a poesia seguiu de mãos dadas comigo, nos versos da poetisa vó Remy (arrasta pro lado e sinta um pouquinho do seu amor).
Ao pé do seu caixão, no dia pesaroso da sua morte, pude recitar algumas palavras minhas de gratidão e reconhecimento, após as palavras religiosas de um padre da cidade. Lágrimas e emoções dos familiares e amigos espelhadas na minha poesia de despedida.
No cemitério, cada grão de terra colocado sobre seu túmulo era poesia dramática e marcava a realidade que aos poucos era assimilada. Muitos foram os abraços e carinhos daquele dia tão triste. Luto vivido coletivamente.
Hoje, em tempos de isolamento, como estão sendo os rituais fúnebres? Sozinhos e isolados, os familiares enlutados têm pouquíssimo recurso para vivenciar esse processo de despedida, com ou sem poesia. A vida impõe um corte ainda mais traumático que não permite aquele abraço silencioso e necessário para acolher a perda inexplicável da morte.
É preciso uma REDE DE APOIO que seja AÇÃO além das formas habituais. Rede presente mais do que nunca, através da palavra, do carinho, da atitude diretiva de se oferecer pra fazer algo pela pessoa que sofre e que na naquele momento tem muita dificuldade de sair do próprio lugar.
Que a gente possa criar junto com o enlutado rituais que façam sentido a sua experiência. Choro chorado junto mesmo distante.
O ritual de luto dá contorno a vivência.
Nomeia e marca, como a poesia, sentimentos e emoções nunca dantes navegados. Ritual é barco na travessia da dor, é bússola que orienta para o amparo.
Se precisar de apoio, to aqui. Sei que o essencial é o que mais falta nesse momento, mas ser testemunha da tua dor pode ser uma poesia que te dá um pouco de chão nesse momento. Conta comigo.
